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Mostrando postagens de abril, 2015

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Suspender o juízo sobre o mundo. Suportar o intenso barulho, o calor e o movimento incessante das coisas que pareciam inertes há um segundo. Sufocar por um instante todas as verdades pré-concebidas. Abraçar com o olhar todas as coisas que nos escapavam mas agora saltam e brilham e se compõem em novas formas novas cores e situações para um olhar que reaprendeu a ver. Surpreender finalmente a oficina das coisas na ação em que o ser finalmente se desvela não passivamente não escravo da mente mas um ser-em-ação que, ao passo em que nos permite conhecer o mundo permite-nos ainda viver um especial estado de encantamento por reconhecermo-nos bem ali no meio do  nosso próprio mundo essa criatura indeterminada que é o homem

Teatro

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Somos todos atores nesse picadeiro antes que a lona desça de vez. Enquanto houver público enquanto houver música dançaremos e cantaremos e sustentaremos nossas melhores falas mesmo que não sejam verdadeiras mesmo que elas não façam sentido ou o sentido seja um mero sentido inventado ou  comprado por um ingresso à meia apregoado em alto e bom som Somos artistas para o olhar do outro porque é esse olhar que nos essencializa nos tira do limbo eterno da não existência e nos arremessa com toda força da vida ali, sobre o topo daquele pequeno picadeiro onde fazemos graça com as tragédias fazemos tragédias com as graças empurramos para frente a vida com medo de tudo que não possui movimento... O que seria de nós sem as luzes os holofotes sobre nossa atuação o que seríamos sem a música de animação sem os aplausos, sem o olhar cúmplice das crianças e dos velhos da platéia? Há público mesmo quando não há show. Porque na verdade, nunca estamos sós. Representamos

O funeral

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Caído na rua como um simples objeto sem vida, um pedaço de pau ou de plástico, não sei. Mas havia algo de heresia e excessiva falta de cerimônia naquilo tudo, na forma como um passarim expunha seus esqueletos inanimados assim ao mundo. Aquele bicho morto merecia algo mais além de ser simplesmente pisoteado pelas rodas dos carros e solas de sapato anônimas. De vez em quando, ainda se submetia à provação de ser farejado de perto por algum cão de rua, que após uma ligeira constatação olfativa, logo perdia o interesse e se varria de volta ao seu destino incerto. Da varanda alta de casa,  antes de sair pra escola, logo cedo eu via aquele ser se desfazendo cada dia mais um pouco, e enquanto contemplava o formato de suas asas pretas e brancas aos poucos tornando-se o cinzento  terroso, ia percebendo a novidade da decomposição ir tomando forma enquanto simultaneamente desconstruía-se o objeto mágico e voador que a própria vida um dia tinha botado no alto do mais alto ar. Não soube