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"Fenda e Vulcão " (Cora Made)

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"Estou farto do lirismo comedido..." (Bandeira) ----------- Me veio de Bandeira a primeira impressão ao ler esse livro lindo. Há duas vozes, aqui, nas duas partes distintas do livro, mas em minha leitura senti como se fossem uma só voz. A intenção estética dos dois momentos traz mais beleza na partição, mas como leitor julgo impossível dissociar  sentimentos, tentar classificà-los para que sejam "puros" ou "cristalinamente definidos",se tudo isso nasce é da mesma fonte, do mesmo ser, da mesma pulsão que vem como vai em vida no movimento das ondas nas pedras , arrebenta e arremansa-- um não-cessar que parte e reconstrói. E mesmo com o risco de soar descabido se o contexto, o tempo, a ordem do dia  por acaso não se configuram uma condição favorável em particular , o poema adianta-se ao desejo sem sequer perguntar, saber ou se importar se existe alguma permissão pra isso. O amor ainda assim é soberano e se põe em verso, fala, atitude e beleza

Saudade

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O quinto livro de Fernanda que me bate nas mãos, eu que, por uma razão idiota qualquer, não conhecia o seu trabalho literário, "apenas" a dramaturgia, até seu falecimento há menos de um ano. Dramaturgia que, por sinal, é uma das melhores coisas que já passaram aqui por estas tristes terras, fazendo com essa máquina chamada televisão pudesse ter garantido uns dias de glória com inteligência de sobra, charme e uma intensidade de mundo sem igual. Surpreendentemente ácido Surpreendentemente doce como a própria autora

Poesia e filosofia

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"Pensar o mundo ou pensar sobre o mundo?" A Filosofia pode transitar pela estética sem ser poema? A Poesia pode aprofundar-se em conteúdos sem se aprisionar no conceito? Antônio Cícero, com sua sensibilidade monstra e uma notável erudição, trilhando  um caminho nada óbvio ao expor essa relação originária. A riqueza e urgência do gênero ensaio,  o link cada vez mais necessário entre Pathos e Logos, coisa inteiramente esquecida por estas tristes bandas. Irmãs no nascimento, nem sempre andaram juntas as duas formas de lidar com pensamentos, sentimentos  e palavras A rigor, não há óbice às interlocuções e descobertas mútuas, concessões e até invasões entre os dois campos que com o tempo criaram outras raízes Mas é fundamental a lembrança -- muito bem explorada pelo poeta-ensaísta sobre a vocação à busca da verdade conceitual, contida  nos pressupostos filosóficos, a eterna busca do universal, enquanto a poiesis, embora sem fórmula única entre formas e

Os passos em volta

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Quando você se depara com a pergunta "Que diabos é isso, afinal?" E não há qualquer resenha, chave ou hermético tratado sobre textos que possa esclarecer a dúvida Esse poeta gigante HH, e uma essencial dimensão dentro da escrita: Nem sempre a coisa que importa é "do que se fala" , mas sim "a forma como se fala" Bonita demais a prosa, esta única certeza Alguma coisa taciturna de "Notas do Subterrâneo", uns toques coloridos do surreal "Cadernos de Malte Laurids Brigge" exercício de giros e mais giros em torno de si mesmo Caleidoscópios do mundo janelando ao redor um diário do corpo enquanto se tranca num quarto para navegar sobre memórias de um espaço-tempo onde a idéia do vivido estende-se à pura transcendência sem jamais perder a carne É como se Proust tivesse escrito isso depois de tomar ácido

Só para maiores de cem anos

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Antologia (anti) poética Suspeito pra falar, porque entendo que nada escapa à poesia Daí que falar em anti-poesia como forma de fugir ao cânone, às formas clássicas ou entender que o destino melhor do verso é cuidar do detalhe do imediato, mais da percepção do que da elaboração isso tudo soa mais como capricho estético ou a defesa de um modo existencial A idéia de que o cotidiano  tudo aquilo que mais salta aos olhos deve ser o melhor objeto Ainda assim tudo isso é poesia Boa coletânea do autor

O tempo e o sentido

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Trabalho magistral  desse grande pesquisador   Philippe Ariés. Escrito há mais de quatro décadas, em hipótese alguma  assume uma tonalidade sombria nos brilhantes relatos e exposições,  como o título poderia sugerir Ao revelar minuciosamente, pela riqueza da pesquisa e a capacidade  única de análise que demonstrou em sua  prolífica carreira, o autor nos mostra como e em que contextos a humanidade se deixou tocar e a forma com que ritualizou a presença da morte em todas as suas variações  As épocas das grandes guerras Os períodos de paz prolongada  e as rotinas em diversos  países e tradições fúnebres  Os períodos de doenças  A grande peste  e as impactantes transformações  que ela trouxe No campo crítico que se estende quase como um desdobramento  necessário diante da paisagem, vai surgindo aos poucos a curiosidade de tentar compreender a demonização da morte e sua absoluta negativação para nossa cultura A d

Paul Auster

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Uma definição da famosa compulsão por livros: se a quarentena durar mais cinco anos, é possível que eu ainda não dê conta da lista de leituras Ah, bendita mania, essa! Fora isso, estendendo os olhos  sobre outros textos. Paul Auster,  que escritor foda! (E como demorei tanto pra descobrir ) O erro tacanho e reiterado por aí afora,  considerar-se, para além do efeito meramente didático , que exista alguma literatura nesse mundo que se deixe aprisionar por  essência à sua circunscrição geográfica, local Há escritores americanos, indianos, brasileiros,  mas a arte A arte fala é do mundo para o mundo mesmo quando olha para o próprio umbigo

Escrever fácil não é fácil

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Sal de frutas contra o excesso de acidez dos tempos e um alerta sobre a necessidade da  arte aprender a lidar com o amargor -- subjacente ao viver, em algum grau --, mas não sucumbir. Há pulsões de vida e morte em constante embate. Potência e beleza, sempre surpreendendo pela forma com que se manifestam.  Quando a arte se afirma em linguagem, é porque a vida está ganhando. Longe dos barulhos do mundo, é sempre um tipo de  felicidade estar vivo e poder provar do instante, contrariando (uma vez mais) Sileno. Crônicas curtíssimas, a incrível (invejável) capacidade de manter a síntese sem perder as asas. Um sopro de vida pelos olhos atentos de um grande escritor. -------- Reunião de textos escritos entre 2008-2017. Ed Sextante,  coleção "Estação Brasil", 2018 Livro vencedor do último Jabuti

Contos

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Uma das melhores leituras desse confinamento A oralidade dos morros cariocas intercalada com a língua culta Como se essa dicotomia,  esse duplo nos constituísse, indivíduos e sociedade, nós e nossos pedaços Uma porrada do mundo no estômago e uma elaboração estética existencial, filosófica ou brejeira Se assim quiserem denominar Sem hierarquias ou verdade absoluta Retratos da condição humana Universais, na necessidade de responder em táticas de sobrevivência ao caos Existe uma guerra, há trincheiras, vitórias e derrotas cotidianas Multifacetados e tropicais, nas fórmulas que cada personagem encontra para chegar, inteiro ou partido, ao fim do dia. Delirios, amor, poesia. Há uma vida que pulsa e jamais se entrega Tudo isso acontecendo tão perto e tão longe de nós aqui embaixo,  nós que, mesmo sem saber, temos participação ativa nisso tudo, nós  que somos "do asfalto", como na fala do protagonista em "Rolezim" na abertura do livr

Poesia marginal

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Uma pulada pra fora do cânone. Ainda que menos conhecido que seus pares famosos da mesma geração, Leminski, Ana Cristina César ,Torquato e Wally, não é menor a poesia de Chacal. Ou, para usar um conceito que serviria bem ao conjunto da obra, talvez o termo "menor" não seja , em definitivo, nenhuma espécie de depreciação do poema em vista da intenção, quando o que se tem em mente e corpo é tocar o mundo pelas beiradas. Seja como for, com certeza Chacal é o mais "Woodstock" da turma e talvez o mais  abusado quanto ao questionamento da forma e à opção consciente pela supressão das camisas de força do poema em favor de uma maior aproximação, segundo a pegada em comum com a  "geração mimeóagrafo" , do conteúdo cotidiano do mundo --  entendendo-se aqui, em primeiro plano, é claro, no caso de Chacal, a caldeira do mundo como o universo infinito-enquanto-dura das noitadas cariocas -- da qual ele é exímio conhecedor.

Poesia Asteca neoconcretista

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Eros em tempos de Tânatos

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Um passeio pelo ocidente, conduzido por Eros, da antiguidade clássica ao contemporâneo. Que beleza de seleção do José Paulo Paes, e que ensaio magnífico de abertura : "Erotismo e poesia: dos gregos aos surrealistas". Cia das Letras, 2006

Tudo e mais um pouco

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Eliane Brum 25-03-2020 - El País -  (Os vírus somos nós) "(...) Mas, não se iludam. Assim que a pandemia passar, o Mercado voltará com todo o seu poder de oráculo para, por meio de suas sacerdotisas, os economistas neoliberais ou ultraliberais, nos ditar tudo o que temos que fazer para sair da recessão. Este ônus, como sempre, será dividido igualmente entre os mais pobres. O vírus —e não as péssimas escolhas— será o culpado de todas as mazelas. Até o corona, como sabemos, a economia do mundo capitalista e do Brasil de Paulo Guedes estava uma maravilha, parece até que domésticas estavam planejando uma excursão para a Disney quando foram impedidas pelo maldito vírus com nome de ducha. E, claro, o maníaco do Planalto vai dizer que não é nem ele nem seu Posto Ipiranga os incompetentes, mas “a histeria” com a “gripezinha”. Nada está dado, porém. Não é só o futuro que está em disputa, mas o presente. Isoladas em casa, as pessoas passaram a fazer o que não faziam antes: enxerg

Leituras

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Serviço: "Depois que o sol se põe", Romance Secult/Funcultura  - Ed. Cousa-Patuá, 2019 preço: R$ 40,00 Link vendas "online" Ed Cousa https://cousa.minestore.com.br/produtos/depois-que-o-sol-se-poe “Depois que o sol se põe” Segundo romance de Danyel Sueth, “Depois que o sol se põe” segue caminho bem diferente do primeiro, “Os Dalmarco”, em vários sentidos. Talvez o mais marcante esteja na percepção de que, enquanto o livro de estréia constrói uma narrativa ora cinematográfica, pela referência predominantemente visual do espaço da ação, ora teatral  pelo desenrolar mesmo da própria ação em sua dinâmica de conduzir falas e personagens valorizando nesse processo muito mais os diálogos que as extensas elaborações argumentativas tão comuns ao gênero, “Depois que o sol se põe” navega por outro caminho, abandonando o ambiente típico de um filme de ação, a imagem trazida pelos "Dalmarco", para abraçar a solidão existencial de uma vida que se coloca em ret

Os Irredutíveis Gauleses

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Albert Uderzo (1927-2020), que desenhou a dupla infalível para ilustrar as histórias incríveis de René Goscinny (1926-1977), uma das maiores criações do universo comics Asterix Obelix Ideiafix Vercingetórix Abracurcix Julius Caesar Panoramix e um caldeirão de poção mágica pra gente tocar a vida

Graciliano

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Da série: leituras ainda que tardias A potente lucidez a elegância do texto a surpreendente atualidade após 80 anos a nos revelar o quanto não nos resolvemos enquanto país esse pulso que vem do sertão a voz insurgente, irresignada solitária e tão forte contra uma outra doença um outro tipo de vírus muito mais lesivo

Poesia, poesia, poesia

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Como sabem os poetas, dançar na beira do abismo é o que mais inspira o verso, e no pulso, vida e morte são muito mais irmãos do que se pensa. Beleza de edição, belo nome pra uma editora "Demônio Negro" , que é poema até no nome.

O mundo começa na China

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Coisa linda esse livro, a poesia tem sempre as picadas de eterno dentro mesmo da matéria

Quatro distopias geniais

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Tchekhov

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Leitor voraz de contos, já me deparei com tudo que é estilo, pulso, gosto, época e arte ao longo da vida. Mas, nesse gênero literário, -- talvez o mais amplo em liberdade que há -- não vi nada ainda como o texto desse grande autor. Parafraseando G. Rosa, é das coisas que você lê não só pela literatura, mas para a vida. Obras completas "Contos de Tchekhov", em 10 volumes, Ed. Relógio D'água