Terradentro

(Para  Diadorim)


Candeeiros, esmeraldas
águas verdes da alma
por botes entre   rugas
de cristais e pedras
--Moço, jamais se apreça
o que entra pelos olhos
nestas vidas, nestas gemas
em paredes de terra

Águas do chão
do deserto, sertão
formas em levante contínuo

escarpados

              solidão.

Bandeiras e coroas,
Veredas: o domínio da selva
(ou como diria um grande amigo
"O relegado do espaço".)

Geografias de gigantes
no abandono  que se quer nação.
jagunçando o miolo da vida
para nutrir os olhos
em reverência

ou revelação

Gerenciar quereres
e continuar amado
desejo apenas de não ser esquecido?
Vida é assim miúda, gente

Menor que seja
sigo, não importa.
seguir sempre
ruminando no caminho
contra toda tempestade
como pedrês  animal de sela
ferido no destino que não aceita
é cumprindo que se rebela
é aceitando que ele rejeita

Destino? O que seria, pois...
viver não é estar sempre
no começo? animal de sela
e toda direção é caminho
e todo caminho é tropeço

Navegar sem bússola,
sem remo, sem tripulação
essa nau dependendo demais da sorte.
chuvas que não atrovoam
bons presságios não trazem.

Terradentro  rasgada,
a natureza por testemunho
e viva comida
o pôr-do-sol sobre o lago
olhos de tudo-ao-verde
pedra lavrada de mina batida

A cada noite uma  nova despedida
as festas de-beber da jagunçada
o peito ermo e longe, sem acolhida,

dansas

lembranças de quando não se era nada
memórias  no alcançável da mão
como se de longe estivesse a vida

O amor do que não se pode
mas não se queda em existir
Saudades, em vida, desejos pueris
estes pertencendo àquilo que viria a ser depois,
em essência de  fazendas em partes
perdidas, sem viva alma, a terra tão desmedida
inteira em suas desumanidades
e em seus desertos
e tudo podendo mudar mais uma vez,
quando o viver se aprochega mais perto
quando este verso vira uma esquina do mundo
e a terra absorve os sonhos, sempre
a terra que gesta sementes

Ladino do que deixei passar
mas deixei porque não sabia:
nunca me inteligenciem na virada de uma só direção
pois vento que é vento e daqueles que levam o sentido
tem que passar pelos lados, lambido
acima abaixo, tocando, demudando
colorindo e preenchendo de razão
pois senão vento não é.

E o sentido
este fica pra depois
quando a soma de todas as realizações
tiver se mostrado concreta, tangível
racional e aceitável o suficiente
para se autonegar até a última raiz dos cabelos
e como todo mote racionalista
abandonando os instintos
abandonando os afetos
até a medula visceral de uma vontade de viver
negada e substituída por algo mais confortável e adequado

Como queria Freud, despertado pelo profeta:
a civilização sobrevive
assassinando seus instintos
(sublimar é coisa pra poucos)

O tempo segue ditando as regras
no passatempo contemporâneo
(matar as horas a qualquer custo)
mas, abdicar de si mesmo é tarefa  ingrata!!...
destilada individualmente no amargor da última hora
e mercadoria pela qual nunca se recebe o bastante...

Tergiversação da própria alma...
(a venda do que não se tem ao demo)
o crime para quem negociasse ao mesmo tempo
pelos favores dos anjos e do diabo
mas sem acreditar em ambos, nem por um segundo
só por insegurança e por descrédito, afinal,
das criaturas supra-terrestres
que habitam sem se quedar ao mundo
aguardando pacientemente na
barca a laureada travessia.

_Levai as moedas para a troca,
pois caudaloso é o Estige
e muito longa a viagem
Uma moeda de ouro para Caronte , na ida
e outra da sua melhor prata
para ser disputada entre Gárgulas e Harpias, na volta
se não queres que teu próprio corpo vire moeda.

Ou como diria Riobaldo
dentre todos, o mais trágico
certo e sem medo é  saber
que o maior pesadelo ainda é melhor
do que despertar sem nunca ter sonhado.