Recordacões da casa dos mortos (Dostoievski)

Gosto dos russos em geral, terra boa pra dar escritor fera, ainda não vi nenhum clássico ruim daquele país. Vou indicar o primeiro que li, "Recordações da casa dos mortos", e a porrada na cabeça que veio na sequência.

Nietzsche dizia, "de tudo que se escreve, valorizo mais o que é escrito com o próprio sangue".. Bom, não foram exatamente essas as palavras, mas é quase isso. O fato é que o russo é um dos grandes exemplos de como a vida e a literatura, independente de gênero e forma, estão sempre imbricadas de forma imprevisível, misteriosa e bela, embora trágica boa parte das vezes.

Esse livro mesmo, veio de uma fase do autor, onde ele havia sido condenado injustamente por conspiração na Rússia czarista, e no instante de ser fuzilado, sua pena foi comutada para prisão na Sibéria, local terrivelmente cruel e árduo nas condições de vida e no cumprimento da pena.

A força da narrativa, extremamente realista, vem do poder de superação pelos anos em que lá esteve, analisando de forma magistral a instituição prisional, o caráter de cada habitante do presídio e através da particularidade dos crimes cometidos pelos colegas de cela, avançando na exploração dos abismos da mente humana. Texto denso, carregado do ensinamento filosófico e existencial que adveio disso tudo. Não é à toa que Dostoiévski é reconhecido como um dos criadores do "romance psicológico".

"A beleza salvará o mundo?" repito a pergunta do personagem de um outro livro do autor, "Os irmãos Karamazov". Pergunta de difícil resposta, ainda mais neste nosso tempo, mas uma coisa é certa: acreditar que possa ainda existir alguma forma de beleza na vida "apesar de tudo", é uma das mais poderosas chaves para justificar senão a vida, ao menos a arte sob um determinado ponto de vista.