Narciso no espelho

Ele tem esse traço delicado
sem deixar de ser viril
Uma suavidade e um desespero
que transcendem em muito
as noções admissíveis que
em geral eu um homem
admitiria para outro
do mesmo naipe
sem confundir as boçais
patrulhas de gênero
(que tempo idiota, este!)

Uma inteligência interativa
que salta logo dos olhos ansiosos
para capturar o espaço do outro
Facilidade nas rodas
e a vibe musical

A capacidade de assimilar
novidades com uma velocidade
impressionante, uma inteligência
ainda que não leve,
mas capaz de densidades generosas

E, por trás de toda aquela
cara feia quando bravo
 e uns rompantes
meio que de menino,
-- descobri logo --
Era um doce esperando
ser apreciado
(um doce desconfiado)

Fôssemos melhores amigos
eu o mimaria com todo cuidado
-- e à sua eloquente fala --, sempre tão
bem arrazoada, para os
dias difíceis

Fosse um filho, eu o quereria
pra mim, não obstante
me lembrar mais um tipo
de pai, desde tão jovem
às vezes excessivamente
ajuizado a dar rígidos conselhos
para um mundo absurdo
que respira granitos

Lembra-me muito a mim mesmo
uns tempos atrás
Só que ele é um eu
muito melhorado
-- devo dizer --

Fosse ele mulher
seríamos antípodas
quase perfeitos
do tipo que se
completa

Fosse eu mulher, eu é que
teria já me apaixonado
meu doce ácido amigo ,
sempre tão distante
sempre tão próximo 
Dentro do mesmo peito