carpe diem


Então estou eu aqui, mudo, nesta sala

E percebo que quase tudo que me ocorre, agora,

Vem sempre de um determinado passado,

Um lugar no tempo
Que julgava deixado para trás.


Esse tempo, que na verdade é busca

Que não sai de mim, que me integra,

Que fala por mim e me define pelas memórias

Tempo perdido esse, que não me larga mais...


Memórias seletivas e falhas, por sinal,

Lacunas que então eu não enxergava

Lacunas que nunca pensamos existirem

E que foram crescendo e tecendo, aos poucos,
Por paradoxo,

Uma improvável textura em torno,

Costurando-nos como retalhos ao avesso das coisas

Com essas linhas invisíveis e duras.

Crianças brincando num jardim.

Nós, que éramos tão poderosos e pensávamos

Poder ocupar todos os espaços,

Pulsar todas as sensações possíveis

Com um violão e uma garrafa embaixo do braço,

Entre tantos risos, beijos e abraços

E aquele cigarro eternamente aceso numa das mãos...

Uma eterna e infantil curiosidade diante das coisas,
Fumaças filosofantes de deslumbrantes auroras

Nadando entre as estrelas, a cada noite

E desfrutando do mundo impunemente

Naquela felicidade despreocupada e linear

Sem precisar pagar um preço

Sem precisar vender algum segredo

Percebo somente agora, embebido

Nesta razão supostamente amadurecida e pretensiosa

O quanto sabiamente nos enganamos

Todo esse tempo

O que havia de bom não eram as coisas em si

Nunca foi o mundo exterior , e nem mesmo

Aquilo a que atribuíamos tantos valores volúveis

Que mudavam ao som de cada nova música

Entre Leds e Floyds, Raul e metais
Playing loud all the time...


Sabíamos, no fundo, dessas possibilidades

Por uma espécie de consciência atávica.

Indo contra todos os conselhos ajuizados,

Sabíamos os hiatos de se viver,

Mas sentíamos também a leveza nos pés.

Curtíamos cada momento, sugando da vida

Sua derradeira gota, no perdido das noites

_O forte das ligas_


Enganávamos a nós mesmos por bem,

Somente por saber, como toda juventude que há,

Que o que importava mesmo era estarmos juntos.

A troca, as descobertas, o contato,

A beleza e as possibilidades infinitas de ser,

Acreditar ingenuinamente na vida,
Nas energias compartilhadas e somadas
E descartando, por triste,
A maneira não-coletiva de se viver...

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...............

....................

Ora, ao diabo com a melancolia, então!

E que morra em mim, doravante

tudo o que não seja muitas pessoas jovens e coloridas
levitando, juntas, a dois metros do chão