Equilibristas

O abandono, a doença
O infeliz desfecho
para o poeta que
legou tanta vida
em seus versos

Vitimado por um mal
que tem levado tantos moços
e fortes mundo afora

O aparato ao seu redor 
Os caçadores de obituários 
salivando, na imprensa
Noticiário, ampla cobertura 

A revelação de uma pegada
tão desconhecida por mim
que venho de outras praias
O encanto imediato
com seu trabalho

Belos relatos, belos artigos 
a exposição bonita
dando conta da sua vida
Da valiosa obra artística 
que fica 

E eu cá, comigo, 
cismando sozinho à noite
entre curioso e mudo
pensando como é possível 
que depois de tudo 

Meu deus, que tempo miserável
gera  artistas dessa magnitude 
para deixá-los morrer
sem dinheiro e abandonados
sem ao menos um plano de saúde?

Indo além,  quase ninguém
(ninguém mesmo, nos dias de hoje)
consegue manter o maldito plano
E essa porra toda é uma máfia dos infernos
contra a idéia benéfica da saúde pública
E os que pagam, a maioria, paga
é lavrando o orçamento no osso

Mas antes que a noite roubasse o sentido do luto
lembrei da tarde inabalável que  caía
feito um viaduto

Porque para uma vida criativa
até os setenta, tendo lutado
o bom combate contra a ditadura
tendo amado tanto, tomado todas
e legado tamanha obra poética

                                  --merecia mais era festa --