Japão

Tempo bom de setembro

Um sopro leve dá vida ao vento

e os bambus e taquaras

no quintal vizinho cantam 

e dão com suas folhas na janela

sobre minha cama


Eu abraço essas folhas delgadas

e simétricas como pontas de flecha 

que vão e vêm 

em sua inconteste flexibilidade 


As hastes verdinhas , mais finas

eu usava quando menino

para pescar 

Os largos colmos rajados de amarelo

são das coisas mais bonitas que há


Canos d'água ou flautas 

Móveis, casas, copos e talheres 

A vivência humana

que tudo encerra


Ou a suave presença apenas 

que se deita no olhar 

Bambus são poemas

com que o som seduzido 

acaricia a terra


(O realismo oriental)

Nenhum povo compreendeu 

melhor a vida dessas  plantas

Lembro-me das pinturas 

de traços finos perfeitos 

A invenção  do nanquim


Vêm a mim as memórias 

de um Japão que só conheci

por livros e pinturas 

Algumas com mais de mil anos


Um Japão imaginário 

que talvez só exista mesmo ali

Muito diferente dos prédios enormes

Da multidão de gentes inquietas

e contemporâneas,  ensimesmadas

e confusas entre tantas máquinas 

depois que entregaram 

sua essência aos cânones ocidentais 


Gentes soterradas 

sob o silêncio soberano

dos séculos


Mas impõe-se a presença dos bambus

E em mim brota um Japão sem fim

De guerreiros e códigos de honra

que desafiam o tempo de nossos pais


Japão desses olhos rasgados

que põem tanta beleza em tudo 

quanto escapa aos  meus próprios olhos


Japão  em que a ponta afiada

(ousada e precisa)

dos bambus que invadem quintais


Corta 

Feito espada de samurai