Poetas
Leio história e não sou historiador
Estudo filosofia e nunca fui filósofo
Amo biologia e jamais serei cientista
Sou só o nada que se põe a falar
Em um mundo repleto de dores
a escassa beleza que (r)existe
é algo que muito me afeta
Daí não me coube outro destino
e eu não escolhi
Foi a vida que me fez poeta
Falo de beleza
mesmo quando o amargo
toma à frente o pulso e as conjuras
(transbordando o indivíduo)
abraçam o coletivo
E as palavras assim tornam-se nada além
da minha pura amargura
Ou quem sabe levado pelo sonho de minuto otimista , o veio alegre eventual
em hiperbólicos delírios flutuantes
Um mundo melhor e mais justo
como nunca visto antes
Ainda que pelas mãos desacreditadas
dos homens
Para o poeta
cuja sensibilidade é instrumento
e que outras esferas vê
Denunciar as condições
de impedimento do que vem a ser
nasce muito antes de aprender a rimar
Não há beleza que perdure
ou ela se evade
Se a vida na natureza é massacrada
de forma covarde a cada instante
se o planeta se ameaça
ou se no fim da tarde não se tem
pão nem teto para agasalhar
Falo impunemente da beleza
como aquele que tivesse certeza
sobre um objeto acabado e pronto
mas isso nem de longe reflete o espanto
que em mim instiga
O impulso atávico que me faz seguir
nem que seja tonto
nem que seja torto
nesses meus rabiscos
que ora me fazem chorar
ora me fazem rir
Não sou sábio, sou poeta
com tudo de inconsequente
que isso alberga
Nos lugares aonde não posso ir
Para a doce matéria que não posso tocar
eu mando as palavras em meu lugar
Nesse meu jeito primitivo e tosco
em prévias de acalentar
Tua beleza é voragem
mais que compleição física
Desafia as formas conhecidas
embora os traços
a façam inesquecível
e tem, sim, algo de terrível
(Muito mais que objeto de alguma certeza)
Como o adjetivo destinado a um bicho bravio
mesmo acuado e ameaçado, que no arrepio
traz em si a calma clara dessa estranha força
Beleza-gesto, generosidade, o encanto
de se partir em tantos, em outros corpos
rebentando em vida à imagem e texto
Cada pequeno reflexo
povoado de uma luz própria que brinca
Numa Terra que tantas vezes
me parece deserta em suas antessalas vazias
esta é a única verdade que em mim concerta
Moça,
Se acreditas na beleza
e entendes de quedas
vôos e fantasias
é porque existe algo de passarinho
nesses teus olhos de poesia
É porque tens uma alma de poeta