Bigô
Ainda moleque, levado pelo irmão, pegava logo o tempo do forró . marcava triângulo, marcava zabumba. o apelido foi por conta de uma sombra de bigode no rosto desde muito moço. Bigodim, que depois ficou só Bigô, que era como todos o chamavam a partir daí.
Antes de me mudar de lá, eu o vi se tornar a referência de baterista revelação juvenil . ainda pequeno atrás dos tambores, era sempre chamado pra incorporar os novos grupos que iam se formando nas garagens da periferia.
Aquele bumbo gigante e uma infinidade de pratos, ele pequitinho escondido lá atrás. tocava no baile, tocava na barraca de lona improvisada da festa da cidade .
Bigô tava sempre lá, o bumbo forte, com muita presença. também era ágil e original na escolha das notas por mãos leves e precisas. um jeito latino de tocar. nunca perdia o compasso, mesmo no improviso.
Do Rock ao Pop, voltava ao forró fácil, depois migrava pra balada, não se cansava. músico da noite, mesmo ainda tão cedo, tem que aprender a tocar um pouco de tudo. o talento natural, a pegada intuitiva, um ouvido privilegiado de sacar o som logo na primeira tocada. a medida interna de ritmo, coisa que se destaca nos melhores músicos.
Voltei lá anos depois e quis saber notícias do artista, sua carreira e performances. estudou, seguiu pra capital? incorporou alguma banda, gravou um álbum?
Não teve tempo. pegou beber nas noites e largou o colégio. na capital exigiam formação musical , além do músico precisar portar seu próprio instrumento. despesas de moradia, alimentação, os melhores equipamentos são caros e a formação completa pela escola particular se tornara inviável com os trocados que tirava acompanhando as bandas. depois que caí no mundo, a cidade passou por outras fases, da última era o mesmo prefeito eleito dois mandatos seguidos. seu primeiro ato foi fechar a escola pública municipal de música. de outra mão, a Escola particular -- que era da cunhada do prefeito -- tava indo muito bem obrigado.
Bigodim, Bigô ,morreu de cirrose antes de completar 18, no mês passado. não teve banda marcial nem lira tocando no funeral.