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O DOMADOR DE VENTOS (Ensaio do vôo enquanto coisa)

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Tarde vento, sol a pino. o elo: a seda , a cola e um menino. entre o morro e o mundo a contemplar pipas, alinhar vidas e sustentar o vôo em suas asas translúcidas num céu seco e azul de pura ventania. enquanto pequenos curumins inexperientes na arte de planar quedavam-se na beirada do campo para apreciação, os grandes pilotos se aprontavam para seus duelos. os menores, arriscando em jerecos feitos de papel comum de página de caderno ou papel de pão. levantados ao baixo do ar com muita corrida, poeira e pouca linha improvisada de costura: fina, imperfeita, linha rompedeira. os maiores, galopando ansiosos o início do esperado mês de agosto, meninada correndo em alvoroço, torvelinho se aventando no antigo campo de aviação. no lugar já não subia nem descia avião, mas era o aeroporto natural das pipas e a casa do vento.... agosto! agosto! Tarde de agosto, pacto  não escrito pela confraria do ar: agosto não tinha pelada a tarde inteira, o espaço do campinho ficava tomado por carretéis

O PAI DO MEU AMIGO ERA UM ESPIÃO

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                      Quando completamos dez anos de idade, junto com toda a sabedoria do mundo, ganhamos ainda uma espécie de sexto sentido, uma antena parabólica mais aguçada e perspicaz, que consegue intuir as verdades das coisas ainda não acontecidas. E aquela verdade foi aos poucos se revelando, à medida em que entrávamos e saíamos da casa do nosso querido amigo A, depois das sofridas e  intermináveis sessões das aulas de quinta série. Estávamos nos idos de setenta e qualquer coisa, pleno auge da famigerada ditadura militar que assolaria o país durante mais de vinte anos. Numa época onde as expressões “sete de setembro”, “patriota” e “nacionalista” garantiam o brilho de qualquer caráter e uma boa reputação, e em contrapartida, os termos “comunista”,  “hippie” e “ter idéias próprias” eram terminantemente proibidas para crianças desde o nascer ao por-do-sol, dentro do espaço que compreendíamos como “rua”e é claro, depois do pôr-do-sol também, até o nascer do sol no dia seguin

A INVASÃO

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                     No começo, ninguém desconfiava de nada. Elas vieram assim, sorrateiras, esgueirando-se por pequenas frestas, povoando nichos de sofás, camas, forros de geladeiras e armários de roupas e sapatos. Com presenças mais discretas e silenciosas durante as estações mais frias, tornavam-se contudo explícitas e corajosas nos dias quentes, anunciando uma nova ordem de terror. Em algumas épocas, tudo silenciava, e inusitadamente passávamos alguns incríveis dias de paz. Mas no decorrer de dois ou três meses,  logo estavam novamente em toda parte, multiplicadas como se durante o suposto período de hibernação tivessem não apenas acumulado força e estratégia, mas também copulado compulsivamente e se reproduzido em batalhões à exaustão durante cada precioso segundo de tempo disponível, dada a quantidade assustadora que a cada ano  só aumentava. Minha mãe se estressava com aquelas criaturas mais do que com qualquer outro tipo de problema em casa. Não tinha questão com vizinh

"O que se cala não nos cura" (Poemas - Casé Lontra Marques)

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"O que se cala não nos cura" (Ed. Aves de água, 2017 -  (Livro contemplado Edital 2016 Funcultura, categoria “Poemas”) " O som das coisas se descolando" (Ed. Aves de água, 2017) Como começar uma resenha que, no fundo, não e´ resenha coisa nenhuma, talvez seja uma “pseudo resenha” ou quem sabe  muito mais uma celebração, uma homenagem e um agradecimento? Pois inicio este textão, novamente sem me desculpar ou pedir perdão a ninguém, primeiro porque amo textão meu e textão dos outros. Com os temas variando desde criação de cachorros e manutenção de guitarra a política, turismo e gastronomia, sempre leio todos, e confesso que, independente de concordar ou não com tudo que leio, eu talvez só continue pelejando hoje em dia nessa estranha rede social de facebook (divina? maldita?) justamente por causa dos textões. Bora lá. A primeira imagem que me veio à cabeça depois da experiência de imersão no mais recente livro de poemas de Casé Lontra Marques, e mais

Resenha : "O Ensaio como Forma" (In "Notas de Literatura - Theodor W. Adoorno)

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“É inerente à forma do ensaio a sua própria relativização: ele precisa compor-se de tal modo como se, a todo momento, pudesse interromper-se. Ele pensa aos solavancos e aos pedaços, assim como a realidade é descontinua, encontra sua unidade através de rupturas e não à medida que as escamoteia. A UNANIMIDADE DA ORDEM LÓGICA ENGANA QUANTO À ESSÊNCIA ANTAGÔNICA DAQUILO QUE ELA RECOBRE. A descontinuidade é essencial ao ensaio, seu assunto é sempre um conflito suspenso “ (Adorno, “O Ensaio como Forma”) ---------------------- "O ENSAIO COMO FORMA" (Adorno) Desnecessário dizer que se trata de um pensador essencial da cultura. Entretanto, este livro, em particular, pela beleza e ousadia de suas abordagens, merecia ser resgatado por quem tem interesse no debate cultural, e em particular, sobre a relação forma x conteúdo, não apenas no que pertine ao gênero literário, mas com possíveis derivações para as humanidades, em geral. Sem ingenuidade, partindo da idéia (nem tão nova)
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Literatura e vida: Ser e linguagem. Relação entre gênero, forma e conteúdo. O Ensaio como síntese possível entre Poesia e Prosa Ser e linguagem, forma, conteúdo e gênero literário. Escrever sobre tudo, alcançar a totalidade. Tarefa pretensiosa e impossível para o pensamento. Não há como apreender o 'todo", se isso mesmo, o todo, é algo que se apresenta a mim, não aos meus sentidos exatamente, mas principalmente a uma certa propensão intelectual como uma categoria da imaginação. Não há essa totalidade, isso é certo. Nem na natureza, nem na tal "vida exterior", aleatória e desgovernada. A arrumação, o sentido, o filtro que aglomera ou separa é artifício humano, e é por isso que a tarefa já fracassa antes mesmo de começar. Dito isso, como alinhavar nessas redes neurais, afetivas, palavrísticas e de sons os infinitos significados das coisas e das inter-relações entre coisas sem arriscar-se a naufragar nesse pântano conceitual? Ora, o poema, meu caro. Já poderia Or