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Mostrando postagens de julho, 2020

Resultado

Pela continuidade pela afirmação e ampliação das políticas públicas de incentivo cultural A forma mais aberta e democrática de resistência que muitas vezes tem feito a diferença É o que ainda temos dessa luz bonita das conquistas A maior esperança de produção e divulgação da arte em nosso meio neste tempo de tantas trevas

Do que não morrem os poetas

Para  Sérgio Blank -------- Poeta pode xingar, cuspir, vomitar Curar-se por uma estação ou eventualmente se engasgar com o veneno dos próprios versos ao qual jamais será imune Poeta pode rir ou chorar sem aparente motivo Desafiar a lógica Superar a noção de perigo Pode jogar com as emoções para além dos territórios seguros Até sentir, por algum paradoxo que ainda está vivo O que no vulgo soaria trágico ou caricato, o repreensível Exagero ou destempero dos nervos No poeta soa mágico sendo a pré-condição de existência desse monstro sensível A pele reflete o peito e a vida se recondensa, se alarga e contesta qualquer razão Zombando da mesma praga que ora o adoece, ora o conduz Pode duvidar até da vida Futucar a ferida pra graça de ver vazar o pus Com a mesma curiosidade e fúria com que desperta furacões acalma multidões em suas águas azuis Poeta pode se travestir quando quer Vestir-se de criança De guerreiro e de mulher De velho, de moço De m

"Resenhas" (Repost em homenagem a Sérgio Blank)

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Primeiramente, um alerta: não sou do tipo que acredita em "arte regional", portanto nem de longe me chamem para celebrar "A literatura capixaba", como se isso de fato fosse algo real, e ainda, algo digno de nota por alguma razão. Trata-se de um enorme equívoco, apesar de largamente usado pelo jornalismo local, esse conceito, porque creio fundamentalmente que arte, seja aqui ou lá no quinto dos infernos que seja produzida, é sempre o testemunho humano sobre o mundo e a vida, independentemente da forma com que seja produzida ou em que se faz para chegar até seu público. Por isso, atrai para si, desde sempre , uma idéia universalista do que é ser gente no planeta Terra, independentemente das intencionalidades ou o contexto de sua produção. Ainda que sejam naturais e louváveis iniciativas pragmáticas e de incentivo cultural do tipo financiamento público para autores e artistas locais ou regionais, seja por município ou estado da federação, ainda que sejam desejáve

Guerra dos mundos

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                      No começo, ninguém desconfiava de nada. Vieram assim, sorrateiras, esgueirando-se por pequenas frestas, povoando nichos de sofás, camas, forros de geladeiras e armários de roupas e sapatos. Com presenças mais discretas e silenciosas durante as estações mais frias, tornavam-se contudo explícitas e corajosas nos dias quentes, anunciando uma nova ordem de terror. Em algumas épocas, tudo silenciava, e inusitadamente passávamos alguns incríveis dias de paz. Mas no decorrer de dois ou três meses,  logo estavam novamente em toda parte, multiplicadas como se durante o suposto período de hibernação tivessem não apenas acumulado força e estratégia, mas também copulado compulsivamente e se reproduzido em batalhões à exaustão durante cada precioso segundo de tempo disponível, dada a quantidade assustadora que a cada ano  só aumentava. Minha mãe se estressava com aquelas criaturas mais do que com qualquer outro tipo de problema em casa. Não tinha questão com vizinhos, or

O pai do meu amigo era um espião

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Quando completamos dez anos de idade, junto com toda a sabedoria do mundo ganhamos ainda uma espécie de sexto sentido, uma antena parabólica mais aguçada e perspicaz, que consegue intuir as verdades das coisas ainda não acontecidas. E aquela verdade foi aos poucos se revelando, à medida em que entrávamos e saíamos da casa do nosso querido amigo A, depois das sofridas e intermináveis sessões das aulas de quinta série.    Estávamos nos anos setenta e qualquer coisa, pleno auge da famigerada ditadura militar que assolava o país havia mais de dez anos e ainda levaria outros dez para acabar. Numa época onde as expressões “sete de setembro”, “patriota” e “nacionalista” garantiam o brilho de qualquer discurso duvidoso e acresciam uma boa reputação a qualquer criatura suspeita sob o sol, e onde, em contrapartida, os termos “comunista”,  “hippie” e “ter idéias próprias” eram altamente perigosas e clandestinas, além de terminantemente proibidas para crianças desde o nascer ao por-do-sol

O domador de ventos

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                                                                                                                                                                                                                                                                                                                      Tarde vento, sol a pino                                                                                       o elo: a seda , a cola                                                             e um menino entre o morro e o mundo a empinar pipas alinhar vidas e sustentar o vôo em asas translúcidas de céu seco em azul de pura ventania.                         Pilotos veteranos se aprontando para os  duelos. Curumins na arte de planar quedam-se na beirada do campo para apreciação. Enquanto a vida ainda não vale, os menores arriscam jerecos de papel comum de página de caderno ou  de pão. Levantados ao baixo do ar com muita correria e empolgação,  pouca

O liquidificador vermelho

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  Mais um domingo antes do almoço e eu folheando calmamente meu jornal, sentado na varanda, em minha cadeira favorita com um copo de cerveja na mão, enquanto me assustava com os infortúnios do mundo inteiro. Com poucos minutos nas páginas principais e tanta desgraça impressa com letras grandes, passo logo ao que interessa, o caderno B e o suplemento literário, que infelizmente vêm ficando mais magrinhos, magrinhos, a cada ano que passa, apesar de tanta coisa boa rolando por aí. Na arrumação entre as folhas de jornais emboladas no colo, cai de repente um folheto desses de propaganda de loja, todo colorido, com suas fabulosas promoções de tudo que é coisa pra importunar o sujeito tranquilo e pacato em sua casa num domingo de manhã de sol. Pego desinteressadamente o folheto, e logo na segunda folha dou de cara com um liquidificador vermelho brilhoso metálico, copo de vidro, com potência monstra de 600 watts, destacando-se entre pífias e tediosas televisões de LCD, I-Phones e seus