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Impostor

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E foi assim que fui parar num sarau, a convite de um amigo e cronista de primeira hora, aqui da capital. Noite de plena quinta-feira, o fim de semana ainda estava apenas apontando no horizonte. Curioso com as apresentações literárias prometidas no evento. Apesar de considerar os saraus importantes fomentadores e divulgadores da boa literatura, nunca senti que tivesse muito o perfil necessário para frequentá-los. Em parte pela timidez ou total inépcia em  ler meus próprios textos, e de outra mão, pra ser bem sincero, porque não consigo entender muito bem literatura falada, verbalizada, sem ter tido algum contato com o texto ou o autor, mesmo breve. Uma heresia, é claro. Admiro quem consegue, mas é um dom que me falta. Reconheço a importância, mas sou meio ortodoxo e surdo em face da palavra falada, e isso muito a contragosto. Acho que é um defeito de nascença, ou quem sabe, tenha havido algum possível passado onde um germe educacional mal plantado ou malcriado impediu que meus

Rodapião

Sopra na gaita a alegria da idade. O menino Nicholas e seus cabelos quase louros e cacheados grandes de sol iluminam a sala quando ele canta seu novo repertório. Cai-cai balão deixou seu sapatinho na boca do sapo que não lava o pé, e no Itororó alguém bebeu água e não achou. Roda moedinha no chão como pião, ele ainda não sabe como faz, e o tio bota a moedinha pra rodar no chão. A moeda de real prata e dourado pega gosto pelo movimento e congela-se na posição de ballet, a réstia de luz do sol poente incide oblíqua sobre o ouro da moeda, sua dança da imobilidade dura vários segundos assim e o menino ri, e olha fascinado para a moeda silente e absoluta, uma moeda quase zenbudista que se equilibra pra ele em absoluto silêncio enquanto reflete com incredulidade seus quatro anos de vida. Nick gosta das panelas da cozinha, ajuda o avô a fazer café, puxa o rabo do Lhasa Minduim e corre pela casa com seu coelho meio urso de pelúcia Batatafita. Não gosta muito de comer, bebe muito suco de uv

Salve, Caju !

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            E lá se vão 30 anos daquela manhã de julho
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A morte e a morte no governo Bolsonaro (Piauí)

Etéreo

Aprendido de pequeno a não falar de corporeidades quando na presença de deus Porque era coisa feia Salvo pelo mundo pelas cachaças pelas noitadas em vão A boemia, os cigarros as mesas de sinuca e as más companhias quando me ensinaram a não falar de espírito na presença da carne O espírito para frutificar necessita, depende parasita um corpo Mas a carne, não As carnes se bastam

Asma

Quem teve asma absorve no próprio corpo uma outra noção de tempo Uma outra concepção de fluxo E tudo parece só poder existir depois que o peito cansado e chiado consegue expandir-se além dos tênues limites ósseos e retornar ao início  em segurança O fluir do espaço na agenda do dia não é apenas  analogia de relógio ombreada em sombras É uma outra coisa, como uma espécie de claridade que não se vê,  mas se prospecta por reflexos Daí a vida, o pensamento, e tudo o mais que implica em movimento padecem pela eternidade com essa sofreguidão de quem é perpassado pelo vento Mas o vento seguirá sempre sendo uma estranha entidade

Um oriente nos ombros

Sustentando fácil um oriente nos ombros Pórticos jônicos tombados e belos Deliciosos arabescos se insinuam para o dia Contrastando os tons que conduzem o vivo Já não há mais sol e ainda assim o brilho cegante de uma  luz

Nuvens

Meu deus! Quando foi que eu parei de ver no céu aqueles crocodilos gigantes os coelhos e carneiros saltando soltos?

A questão política decisiva do século XXI | MICHAEL LÖWY

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Capitalismo e Colapso Ambiental - Luiz Marques

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Catástrofe ambiental e a lógica capitalista | por Virginia Fontes

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A França puxando o barco, em mudanças importantes nas primeiras eleições pós-Covid

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Socialistas vencem na França (UOL) Verdes e socialistas confirmam tendência  (DW) Ecologistas e socialistas na primeira eleição pós-Covid  (El País) Socialistas vencem na França  (Carta Capital)

A máquina (Economia Política, parte I)

Smith, do alto de seu iluminismo todo achando que bastava a vontade atávica O homem querendo levar à frente sua própria veia empreendedora, como  no ranger das tecelagens recém-iniciadas em sua terra natal "Laissez faire", que haverá sempre uma mão invisível a consertar os grandes erros Uma racionalidade latente inscrita no cerne da vida -- força benévola a empurrar o humano para seu destino de grandeza O governo servindo apenas como meio de manter a ordem e garantir a fiscalização de um jogo que se auto-regula Seguiríamos assim, numa sociedade perfeita conjugando perfeitamente meios e fins e estaria certificada a felicidade coletiva quando a ação, mesmo individual e egoísta servisse de forma indireta para puxar à frente a carga da história, em inventividade dividindo seus dividendos livremente com o resto da humanidade A realidade, como sempre mais rasteira, tratou de demonstrar, nesses últimos 200 que embora tenha se desvencilhado do antigo regim

A diversidade e as cores do humano contra o fascismo

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A diversidade e as cores do humano contra o fascismo  50 anos de Stonewall: saiba o que foi a revolta que deu origem ao dia do orgulho LGBT (BBC)

Hypnotised

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(Simple Minds, "Good news from the next world", Virgin Records, 1995)

"Os caminhos da liberdade" (J.P. Sartre, trilogia)

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Os volumes da  trilogia "Caminhos da liberdade" "A idade da razão" "Sursis" "Com a morte na alma" Juntamente com o ensaio "Que é  a literatura?", onde defende o engajamento do escritor e um papel inovador para a literatura, o romance "A Náusea" (incrivelmente escrito antes da segunda grande guerra, expondo pontos-chave da filosofia existencialista que seriam mais desenvolvidos posteriormente, e profeticamente antecipando um status de humanidade que só surgiria a partir da guerra), a belíssima autobiografia de "As Palavras", onde inaugurou o estilo literário de "autobiografia inventada"  e o livro de contos "O muro", ainda hoje retrato das subjetividades contemporãneas, isso tudo  faz de Sartre, quase que independentemente do seu vasto trabalho filosófico em paralelo, um dos principais e mais prolíficos escritores do séc XX. E como não podia deixar de ser , o tema principal que p

O mar

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O mar armou com o amor de me ensinar a amar Assim, do seu jeito de mar Uma hora me afoga Outra hora me traz à tona para respirar Mas um dia ainda aprendo como quando menino no meio de todos aqueles caldos também  aprendi a nadar

Orvalho

Aquando a manhã súbita o surpreende sem sono (Não que tenha dormido demasiado ) Mas a pujança do mundo desde cedo acordado lhe falou mais alto que a anunciada em sonho E todas as palavras que existem  e também aquelas que ainda não foram escritas nem soadas, parecem dotadas de uma vontade de se instilar e aguardam ansiosamente o seu despertar A folha branca te olha de banda Desperta-se, ainda situado na transição em andamento por esses dois mundos Entre a vigília e o sonho há uma terceira categoria Fugidia, fugaz mas de uma beleza atroz Como se por dentro uns outros olhos sonolentos fossem vendo coisas que daí a pouco quando o café fizer efeito e a máquina do mundo se puder a girar se dissiparão em pleno ar É por isso que, sabendo da perda breve dessa magia alguma coisa por dentro segue renitente, querendo brincar É tudo diferente aqui e agora (A absurda imensidão que pode habitar um quintal) Mais ainda nesta época do ano onde mora nas costas das

Cinema, literatura e metalinguagem

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(Eungyo - Coreia,  2012) Quando a poesia na tela transcende à própria narrativa e quer mostrar, pela dinâmica entre beleza, dor, desejo,criação e cotidiano, que tanto a vida quanto o verso jamais são lineares e habitam o mundo variando entre incomensurável silêncio e ruidosa potência antes de se tornarem arte. A curiosidade do filme, que é coreano, uma adaptação do romance do escritor Park Bum-Shin  mas reflete intensamente -- em alguns momentos literalmente-- estéticas e formas narrativas muito próprias de alguns autores japoneses. Um possível "olhar oriental"que transcende nacionalidade? Uma tentação, esse vício de nós,  ocidentais, atribuirmos um excesso de semelhança ao desconsiderarmos que, apesar de repleto de permeabilidades e histórias conjuntas, -- até  por conta de reinos contíguos ou geminados que posteriormente se erigiram em nacionalidades e culturas próprias -- não  se trata da mesma coisa. Pegando bem de perto a China, a Coréia e o Japão de hoj