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A dança

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Pairar sobre palavras cantadas andar solta sobre flâmulas dançantes e brasas com graça, sem se queimar essa a arte da leveza , de plumas não se dança sem  mágica O corpo levitando sobre o chão sustentando-se no ar vencendo a gravidade, por mágicos segundos que parecem parar o mundo silêncio inequivocamente belo Texto corporal e link para o universo metáfora de si mesmo, o corpo a criação o movimento sendo a interação que divide o gesto braços que cortam o ar, a pena língua plena sem  palavras, versos corporais sobre o papel em branco e preto do espaço gravados entre o ar e  a carne sôfrega e trêmula concisa, precisa, ritmada intensa, sensual, relaxada Linhas escritas sem uma palavra sequer palavras que soam  melhor caladas quando a dança entra em cena

Plenitude é somente uma palavra

Guerra maior é a que acontece no silêncio de dentro batalhas sem nome, indesignáveis eventos milhares de mortos, centenas de feridos conflitos resultado de se estar vivo, respirar  e não se resignar ao simples sobreviver Busca incessante desta alma , inquietude pelo que  ficou para trás, quando me perdi em algum lugar do caminho. Plenitude? Não há, posso dizer. A vida é a soma de tudo que ocorre, mas perpetua-se somente na memória dos  bons momentos. O que vejo de real são apenas os  fragmentos... ser humano é sempre estar faltando um pedaço. "Diante da grandeza do mundo, torna pequeno teu coração", diz o provérbio chinês... ouço esse ditado amarrando meus braços, acorrentando meus pés mas algo de rebeldia insiste em não acreditar num mundo zen, algo salta esse muro e grita que a vida é mais , a vida é mulher e é assim meio doida mesmo, imprevisível nessa sua maneira íntegra e alucinada de encantar e exterminar e que, se há algum equilíbrio, ele sempre fu

o tempo

A mirada das cavernas vejo só um pálido sol situado no horizonte Vejo Platão e suas sombras refletidas, grilhões criados pelos próprios escravos sob o medo da liberdade pois a liberdade sempre amedronta Esse barco do tempo veleja rápido demais e na vertigem de já estar aqui, agora sinto calor em agosto como se ainda fosse janeiro

Sobre vampiros

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Entre as gélidas rochas desta cela abandonada mil anos aguardando e padecendo  a eterna sede  que nunca é saciada Metamorfoseando em asas o desejo, morpho chiroptera deixo minha cripta e rasgo a noite sobre a Terra os instintos intactos, um vôo cego e rápido, Nosferatu e um domínio de Fausto sobre o que o mundo integra. Você dorme, inocente, na escuridão do imenso quarto sinto seu calor e o coração nos seios agitados a ansiedade da lua imensa prata convite ao banquete onde será servida sua juventude em grandes taças Sua pele clara brilha nas sombras, deleito-me com a visão enquanto mordo seu pescoço você me pertence,agora seus humores e sua essência circulam em meu corpo e alimentarão minha sombria existência enquanto lego a você uma fração do meu ser imortal sugando até bem perto do fim a sua linfa vital doce fluido cristalino enquanto vejo, por  lascívia,  sua vida aos poucos se esvaindo Seu corpo contorcendo-se em grito

O silêncio

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Há poesia demais em não falar nada um romance não escrito quando penso em você contos que dormem intactos sob o travesseiro crônicas de uma vida que anda de lado, sem porquês. Se eu não nascesse hoje, tornaria a morrer sem revelar esse mundo sem participar o liame das coisas, entre o sólido e o abstrato mais profundo, aquele lugar onde tudo o que há se revela na história do mínimo, enquanto se perdem, assim, os seres recém surgidos do limbo, antes de inaugurarem qualquer estado de consciência. Àtomos e palavras, urdidas na calada da noite inacabada, inocências... Neste filme que passa bem diante dos meus olhos vejo cores, o campo, bichos, flores e mato alto, então estou integrado nesta tela impressionista, e sou a própria imagem do que quero ser: sou campo, sou bicho, flores e mato alto repleto de pontos de sombra e luz, sob cuja fragmentação espelhada possibilito a visão, enquanto imponho meu olhar, esse tirano trocando a realidade pela impressão. Sou também o pintor que tudo observ

Vida Minha

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*Por Marcos Silva Oliveira A cidade emitia sinais de vida no cotidiano. Recordo bem o texto e a mensagem. A angústia não era dor definível e não doía tanto quanto agora. Nós estávamos para o que der e vier - o possível. O improvisar e as tentativas de reviver dia a dia o lúdico: eram presentes. A fotografia do instante. Estão nestes versos que encontrei ao remexer em papéis antigos. O pardo das luzes passadas. A metáfora daqueles instantes: momentos de 1984. Ao largo da paisagem Do que posso vislumbrar As luzes e a amplitude Da cidade entre as trevas. Parques de sonhos... De luzes amarelas O carro estacionado A cancela de madeira Atrás os penhascos Da minha angústia... A noite perigosa A cidade baça Ameaçada das trevas: A missão salvá-la... A cura. Nesta noite silenciosa Temos medo. Muito medo. Os postes de luz Os cabos de telefone, 1984, a cidade resiste. Eu devo salvá-la... A missão para a salva-guardar. Oprimido pela noite Decido a proteger: A cidade me precisa... Os penhascos e a

carpe diem

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Então estou eu aqui, mudo, nesta sala E percebo que quase tudo que me ocorre, agora, Vem sempre de um determinado passado, Um lugar no tempo Que julgava deixado para trás. Esse tempo, que na verdade é busca Que não sai de mim, que me integra, Que fala por mim e me define pelas memórias Tempo perdido esse, que não me larga mais... Memórias seletivas e falhas, por sinal, Lacunas que então eu não enxergava Lacunas que nunca pensamos existirem E que foram crescendo e tecendo, aos poucos, Por paradoxo, Uma improvável textura em torno, Costurando-nos como retalhos ao avesso das coisas Com essas linhas invisíveis e duras. Crianças brincando num jardim. Nós, que éramos tão poderosos e pensávamos Poder ocupar todos os espaços, Pulsar todas as sensações possíveis Com um violão e uma garrafa embaixo do braço, Entre tantos risos, beijos e abraços E aquele cigarro eternamente aceso numa das mãos... Uma eterna e infantil curiosidade diante das coisas, Fumaças filosofantes de deslumbrantes auroras Na

The fool on the hill

(**sobre música de Lennon e McCartney) Isolar-se no topo da montanha entre paus, pássaros e pedras defesa e fuga necessária, junto aos ventos para este tolo que agora descansa e respira, pela primeira vez depois de muitas eras Lutando contra tudo e todos buscando nada mais do que o que lhe parecia verdadeiro com a coragem suficiente para lançar-se a novos projetos quando percebia ter errado o alvo quando sabia ser toda verdade relatividade, nada mais que um ponto de mirada sobre o mundo Missão de tolo essa, na Terra um tolo isolado numa montanha tocando seu violão relegado ao seu próprio mundo longe, agora, da solidão encontrando-se a si mesmo sempre a maior descoberta no silêncio absoluto entre os ventos cansado de andar contra tudo e todos buscando a força nos etéreos elementos quando nada na terra parecia suportar ou compreender sua necessidade de elevação Ver o sol se pôr é seu único consolo ver o mundo girar enquanto toca sua desafinada viola e

Esse ofício do verso

Nesse ofício do verso nenhum parto vinga sem dor a escrita é sempre uma vitória sobre si esteja onde estiver o escritor Não há lugar privilegiado para o pensamento idéias são coisas que surgem a qualquer tempo, num insight, num devaneio, num tropeçar afastados ou registrados os infortúnios quando a palavra nasce no papel: labirintos possíveis para a vida humana Muitas noites mal dormidas essa eterna inquietação às vezes superada, pela manhã nestes caminhos sobre a folha neste peculiar nascer do sol A busca do universal que não existe compõe-se a escrita de temas, estórias e instante harmonia dinâmica e geografia flutuante que mescla impulsos, sensações, vivências com sangue, trágédia e dor mas também onde o lúdico ganha espaço assim como o amor Alegrias e tristezas, pessoas e despessoas e o mundo lá fora, sempre impassível variando mesmo é nossa percepção do mundo nossas vivências exageradas ou contidas nunca desprezadas, tornadas mais vivas imortalizadas no legado, na obra na contempl

Quasar de um dia calmo

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Estive no vento Deixei-me levar pelas horas das horas As horas sem tempo O espaço, o momento As deixas, as perdas, eu estive no vento Minha poeira , eu, De mim a me perder Minhas partículas se esvanecendo Dissolvendo-se no éter Nunca cheguei a ser algo, na verdade Esse emaranhado de discursos não Pode ser alguém Não me conferem qualquer identidade Tudo não passou de uma brincadeira Os jogos da divina criança Esse feixe de células que tantas Vezes morreram Tantas vezes reviveram Esse arrazoado de possibilidades Em torno de mim Não fazem o que sou Eu fui outros em vida Eu morri de novo, mil vezes Renascendo todos os dias Para me tornar a perder, Para ser a fala de um outro sobre mim Mas isso não define o ser Pois o ser só se encontra com o mundo no estar aqui Estou partículas , estou almas Estou metais em poeira de energia Desintegrando-se pelo cosmos agora,

O perfume de Laura

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Ao nascer, o que se vê, o que se ouve primeiro? Como aconteceu com Grenouille, acontece com todos, no mundo inteiro. Se a memória tivesse voz, aos berros diria que nada se vê e nada se ouve naqueles segundos, e é pelo cheiro que nos toca o sentido do mundo , não importando que alguém tenha vindo à luz entre finas rendas ou em meio à lama. Primeira consciência: acordes e blends, antes de enxergar. O cheiro da mãe, do berço, dos primeiros brinquedos: leite, vida, alimento. Amêndoa, cedro, limão, jasmim. Respiração. Pulmões se abrindo, o sofrido choro. Patchouly, vetyver, sândalo, alecrim. Antes de pensar, antes de andar. Bergamota, gerânios, musgo de carvalho. Antes de ouvir. Almíscar, incenso, thymo, tomilho. Antes mesmo de chorar, e muito antes de falar. Sálvia, âmbar , gengibre, cardamomo. Café, couro velho, tabaco, cipreste: em cada corpo, um resultado diferente. Chocolate, óleos, essências, fougére: a fixação lânguida lambendo a pele. Entre os seres, o cheiro precede a fala. Cio e

Palavras em febre

livres da lida, a queda de não pertencer aos espaços vazios nem solo nem arcos, tampouco anima titubeando linha acima sem ter um talvez saber a vida nonada, sem horas não aparecer colo, carinho, calor você a você silentes de calvas, os circos na festa, na dor de querer -não- querer vicissitude, vontade perfeito sabor rito que dita a fuga amor desamor soltos a viver navios viagens , imensidão ritos extravios de amarga prisão nuvens, névoas, sombras ebulição da alma sobre as palavras sobe a palavra desce a alma perde-se a alma ícones e signos perdidos loucura da velha que grita a despeito da morte

Entrevista

Marcos Silva Oliveira* O escritor Franco com todo o aparato da fotografia em Parati com a objetiva focada nos casarões antigos e na paisagem, no bucólico das ruas, com toda aquela gente a transitar interessada na literatura, o pessoal do programa de Tevê “ Entrelinhas ” a entrevistá-lo... Enquanto fotografava as perguntas eram feitas... O motivo de estar ali, seu trabalho, o fato de ser reconhecido como escritor por todos os presentes – dizia tudo. Recordo três dias depois o programa da Tevê “ Entrelinhas ” apresentando as respostas objetivas do Escritor Franco e suas fotos em cortes da cidade de Parati, colorindo o calor de sua conversa descompromissada da entrevistadora. Achei belo este recurso cênico. Escritor interessado em fotografia, desde então, pareceu-me elegante. Escrever foi dito por Franco ser entretenimento e arte ou uma viagem sem compromissos, livre de propósitos, mesmo o papel alegórico da arte, colorindo nossos dias fúteis e sem alegria – ent

Playing with fire

Melancolia , companhia Uma suave melodia Tédio triste, fuga Da rotina Essa lua enorme a me olhar estranho Sobe a noite, cai o dia Não sei pra quê tanto brilho Esse desencanto tamanho E aquele ar blasé sobre a humanidade Angústia é querer voar, Possuir asas A energia de um vulcão ativo E as unhas roídas de não saber para onde Sem saber nunca para onde Sem nunca saber Sem saber das asas, Batendo de ansiedade Angústia é esperar demais para agir E a nítida sensação , depois, De que se deveria ter alçado vôo Enquanto se podia Depressão, esses sapatos de chumbo Essas cortinas da sala sem sol Fechadas em torno de si Essa ausência de luz O cansaço, as correntes atadas às pernas A necessidade da sombra A ausência de comunicação A ausência do movimento Semente plantada que nasce para dentro Na escuridão Essa sensação familiar De que o mundo é algo entre o estômago e o pulmão Esse equilibrista numa longa corda Sobre o abismo que é viver